26/04/14

Resenha: Em Busca de um Final Feliz - Katherine Boo



Em Busca de um Final Feliz
Katherine Boo

Novo Conceito
288 páginas

☺☺☺☺
Em Busca de um Final Feliz, de Katherine Boo, é um livro brilhantemente escrito. Através de uma forte narrativa, descobrimos como é o dia a dia dos moradores de Annawadi, uma favela à sombra do elegante Aeroporto Internacional de Mumbai, na Índia.
A história de seus habitantes nos faz rir e chorar, porque “;o que é celebrado neste livro não é o que poderíamos chamar toscamente de ‘o encanto da lama’, mas a riqueza das pessoas que — para o bem e para o mal — compõem um tronco social que está cada vez mais presente no nosso mundo moderno”;. (Zeca Camargo, em prefácio a esta edição).
O leitor vai se apaixonar por Sunil Sharma, o menino catador de lixo que quer ficar rico, por Manju, a moça mais bonita da favela, que quer ser professora, e até pela tresloucada Fátima, a Perna Só, que só quer um pouco de atenção.

Olá, queridões e queridonas que leem o Sacudindo Palavras! Não, eu não morri! Estou vivíssima! Passei mais de um mês sem postar aqui, é verdade, mas sabe como é... conciliar vida de atleta com vida acadêmica é uma tarefa que exige muito jogo cintura e, às vezes, me perco no ritmo dessa dança e acabo negligenciado o meu querido cantinho. Para vocês terem uma noção, a situação está tão crítica, que eu mal li nesses quatro primeiros meses do ano. No entanto, resolvi ser uma pessoa mais pragmática: deliberarei um horário para todas as minhas atividades. Não que pretenda robotizar meus dias, é mais uma necessidade de fazer tudo o que eu quero e gosto de fazer, sem negligenciar nada. Não preciso seguir à risca, para não quebrar a naturalidade da vida. É sempre bom se deixar surpreender pela existência, mas também é agradável ter metas traçadas. Diante disso, quero dizer que vou tentar não mais negligenciar as minhas leituras, postagens do blog, atividades concernentes ao curso de Biblioteconomia e ao projeto Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC). Estou na segunda fase do projeto, que acabará em julho desse ano. Pretendo finalizar o meu trabalho de forma louvável etc e tal. Enfim, tentarei ser menos negligente e mais eficiente para com as minhas adoradas atividades, principalmente com o exercício de ser blogueira, coisa que faço desde 2008 e me faz um bem indizível.
Pois bem, depois dessas breves justificativas acima (ou não tão breves assim), é hora de falar do livro da Boo, Em Busca de um Final Feliz, livro que levou o maior prêmio literário dos Estados Unidos, o National Book Award, na categoria não-ficção. Katherine é uma jornalista investigativa, muito bem conceituada por seu trabalho extremamente honesto e bem feito. Segundo as minhas pesquisas, Boo ganhou um Prêmio Pulitzer no ano 2000, pela sua cobertura sobre o estado lastimável dos locais públicos que tratam de deficientes intelectuais. Ainda não tive oportunidade de conhecer esse trabalho dela, mas tive, felizmente, contato com o seu livro de não-ficção sobre a vida, a morte, a esperança e uma outra gama de sentimentos sobre os moradores da Annawadi, uma das muitas favelas indianas. Livro cedido a mim pela Editora Novo Conceito, parceira do blog. Não é a mais populosas da Índia nem a mais pobre, de acordo com o que pesquisei, no entanto a dura realidade vivida por seus moradores é tão contundente quanto qualquer outra, de qualquer outro local.
Katherine retrata a realidade dos moradores de Annawadi tal como ela via, sem maquiagem, sem eufemismo, mas, em compensação, com muita sensibilidade. Os moradores de Annawadi, uma favela escondida, por trás do aeroporto e hotéis luxuosos de Mumbai, visualizavam a disparidade do luxo que era ostentado bem "nos seus narizes" e, no fundo, se imaginavam saindo da miséria e ter a chance de desfrutar, mesmo que em uma dose menor, toda aquela vida glamourosa que se dava a poucos metros deles. Boo tem o dom de captar até mesmo o que não pode ser captado pelo olhar ou a lente da sua câmera fotográfica.
Entre tombos na lama do esgoto a céu aberto de Annawadi, nas suas horas de filmagem do cotidiano da favela, e repetidas entrevistas com os moradores do local, Boo construiu uma história que causa comoção, compadecimento, ira e revolta.
Pode-se verificar que aqueles moradores vivem no limite: ignorados pelo sistema corrupto, pelo governo que, além de não garantirem o mínimo possível para que eles tenham uma vida digna, no sentido de terem os seus direitos assegurados, de moradia, saúde e segurança, ainda os extorque ao máximo. Devido a essa corrupção desmedida e cruel, os moradores passam a ver nos outros um rival, alguém que também deve ser extorquido, porque vence o mais esperto, ganha as batatas quem tirar maior vantagem dos outros. E quando digo isso, não os culpo, porque eles não conheceram outra vida. É o meio pelo qual eles entendem que podem sobreviver, que podem resistir num sistema tão implacável. Destroem-se uns aos outros não pelo prazer de serem cruéis, mas sim porque entendem, que, por tudo que já viveram, é o único modo de seguir adiante. 
É difícil "manter-se gelo" (se vocês lerem, entenderão essa expressão usada por Abdul) quando fazem de tudo para que você derreta e seja mais um deles. É difícil ser bom e justo quando o sistema massacra tudo, com sua sanguinolenta (usarei agora um termo muito usado pela minha amiga Jaci, do blog Uma Pandora e Sua Caixa) política. 
Por tudo que disse aqui, creio que vocês puderam perceber que não é um livro fácil, no sentido de ser uma distração do cotidiano, abstração dos problemas ou coisa que o valha. É um livro extremamente válido, por jogar na nossa cara uma realidade que muitas vezes a gente conhece, na teoria, mas que não paramos para pensar de verdade e denunciar, seja por meio de um livro, seja por meio de um movimento de revolta, de exigência de mudanças. Ninguém quer viver à margem da sociedade, porque é duro, é cruel, é impossível, é deprimente. As pessoas querem ter oportunidades, querem ser vistas como gente. Porque, pelos relatos de Boo, a maior parte dos moradores de Annawadi se sentem à parte do mundo. Cada um deles, por consequência do modo bruto e nada amistoso como são tratados pelo sistema policial local, calcula a sua vida como sem importância alguma. Durante o livro, temos a tristeza de conhecer como funciona o policiamento de Mumbai. As coisas funcionam à base de ameaças, de extorsão e morte. 
Fátima, a annawadiana de uma perna só, extremamente vaidosa e tão carente de afeto e atenção. Por um momento a detestamos por ela culpar e castigar quem não tinha nenhuma culpa pela sua desolação e mazelas. Porém, ao mesmo tempo, se formos analisar a sua infância e toda a sua vida, de maneira cautelosa, podemos entender, ainda que minimamente, as suas ações. Quando digo entender, não digo que isso justifica fazer o que ela fez. Porém, não podemos colocar as "Fátimas" da vida num poste e linchá-las até a morte. Esse não é e nunca será o caminho. Abdul, um menino retraído, que não conhecia nada da vida a não ser um trabalho, precisou conhecer os outros lados da vida e ampliar a sua visão de mundo em decorrência de uma terrível injustiça pela qual passou. A vida às vezes lança peças em nós que verdadeiramente não são justas, porém, de um modo louco e inexplicável, nos faz crescer e maximizar o que conhecíamos por vida. Asha, mulher que deixou que seu coração fosse ressecado pelas as suas vivências na infância e adolescência, o que a tornou uma mulher extremamente racional e inescrupulosa. Manju, filha de Asha, cheia de sonhos, mas, sempre que as suas asas parecem surgir, é impedida de voar por não ter ousadia de peitar o sistema e o que quer que seja para ser quem ela quer ser. Sunil, um garoto inteligentíssimo, que tanto queria ser feliz, sair da favela, para ter uma condição melhor de vida. Acabou que esse menininho passou por maus bocados, trilhou por caminhos tortos até poder voltar ao caminho correto, ainda que seja o caminho mais rechaçado pelo sistema regente em Mumbai. 
Poderia falar com mais detalhes de cada um dos personagens. Todos, à sua maneira, me tocaram e ficaram em minha memória. A miséria, a fome, o trabalho incessante, que dava um lucro tão pouco, mas tão pouco, que mal dava para aquela gente se alimentar. 
Katherine falou de favela, de pobreza, mas, sobretudo, de seres humanos, que, ainda que destituídos de riquezas materiais, tentam preservar um fiapo de esperança em dias melhores em seus corações e, principalmente, são inteligentes, criativos e dão o seu jeito de sobreviver em meio ao caos.
Esse livro de não-ficção é indicados para mim, para você e para todos que não temem conhecer uma realidade dolorosa, mas, principalmente, real e que precisa ser mudada. Não porque ser pobre é feio. Não há nada de errado em ser pobre, a não ser pela pobreza, pela falta de oportunidades, pela luta desumana para sobreviverem. A pobreza deve ser combatida porque todos, todos sem exceção, merecem ter seus direitos garantidos. Os governantes nos devem isso. É uma tarefa difícil? Sem dúvida, especialmente quando a corrupção impera. Nós também temos a nossa parcela de culpa pela corrupção e desmandos do governo imperar. Quando nós nos dermos conta da força que temos, e, unidos, lutarmos contra quem não quer mudar a nossa realidade, talvez possamos fazer um mundo melhor.

Nesse vídeo, que encontrei no site oficial do livro, podemos ver um pouco de Annawadi e seus moradores:


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Encontrei também uma entrevista com a Katherine Boo, realizada em março de 2013, feita pela colunista Lúcia Guimarães, do Estadão . Cliquem aqui para ler a entrevista.

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Por hoje, é só.
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Um grande abraço da @ericona.
Hasta la vista!

11 comentários:

  1. Eu ganhei esse livro em um sorteio, mas ainda não consegui pegar ele para ler. Acho que não estou no momento de ler um livro assim. Já esperava dele tudo o que você falou na resenha.

    Blog Prefácio

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  2. Eu sou apaixonada por esse livro Erica, ele está no canto da estante destinado aos livros cujos personagens foi difícil abandonar após a ultima linha lida... Ele mexe com o coração de quem ler porque é muita realidade e nós temos o habito de ignorar a realidade. Infelizmente, como disse Ulisses Tavares, "há gente passando fome e não é a fome que você imagina entre uma refeição e outra" néh?!?!

    Mas, é necessário mergulhar na realidade para conseguir melhora-la em algum momento. A Natalie fez isso, gritou para o mundo sua indignação e nos premiou com esse livro inquietante, incomodo e fascinante.

    Adorei tua resenha... E sim, também eu tenho tido pouco tempo para os blogs, o trabalho consome qualquer um...

    Cheros, Pandora.

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  3. Nossa ótima resenha!!!!!
    Bjs
    http://eternamente-princesa.blogspot.com.br/

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  4. Esse livro parece ser INCRÍVEL. Ainda estou esperando o momento ideal para lê-lo, até porque ele parece ser bem pesadinho para o momento que eu estou agora, mas com certeza já está entre as próximas. <3

    Um beijo,
    Luara - Estante Vertical

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  5. Érica quanto tempo, ainda bem que voltou, mas sei como é ter conciliar tudo, imagina você, faculdade, atleta e tudo mais, fico feliz em ver de volta! Amei a resenha, apesar de ainda não ter lido nenhuma resenha antes da sua, eu gostei e me interessei em ler Em busca de um Final Feliz, só a sinopse já me cativou, parece forte e muito bom! beijinhos amiga

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  6. O jogo de cintura é o que tem te deixado com essa cinturinha fina, hã?
    haha
    Ótima resenha, bem completa e cheia de opinião. Talvez eu não esteja em um momento de ler um livro pesado assim, tô numa fase mais light rs.

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  7. O livro é bem interessante mesmo e com a tua resenha completíssima não tem como duvidar do que podemos esperar dele. Mesmo assim, é uma leitura que não me interessou para 'agora', entende?! Enfim, fica a dica ><

    Beijos
    http://mon-autre.blogspot.com.br/

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  8. Nossa, eu não fazia ideia que o livro era assim! Tenho ele aqui tbm, mas até o momento não li. A resenha ficou ótima, parabéns! E volte logo com mais post heim ;)

    xoxo
    http://amigadaleitora.blogspot.com.br/

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  9. Eu tenho um exemplar deste livro aqui em casa, mas confesso que ainda não li por puro medo das minhas emoções, eu tenho a certeza absoluta de que esta leitura irá me tocar demais....mesmo assim, acho que as vezes precisamos exatamente disto...

    Beijo, Van - Blog do Balaio
    balaiodelivros.blogspot.com.br

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  10. Ei Érica

    Realmente as vezes é difícil arrumar tempo para tudo, as vezes surto um pouco para dar conta rs.
    Eu não consegui gostar deste livro, já vi várias resenhas que elogiam muito mas para mim achei tudo uma desgraceira sem fim, nem consegui me emocionar de tanto que me irritei com a narrativa. Sei lá, eu sabia que era não ficção, mas ela conta a historia de forma romanceada, fica parecendo ficção, e depois termina tão no ar, não consegui gostar.
    bjs

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  11. Olá Érica! Amei tua resenha, super bem escrita. Eu não li esse livro e nem tenho,mas gostaria muito. Parece uma obra emocionante e reveladora.
    Beijos!
    Monólogo de Julieta.

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